burburinho

moreira da silva

msica por Nemo Nox

J perto dos cem anos de idade, Moreira da Silva no dispensava o terno de linho branco, o sapato de duas cores e o chapu panam, uniforme tradicional do malandro profissional. E se algum merece o ttulo de ltimo dos malandros, este algum Moreira da Silva, com uma coleo de impagveis sambas de breque para narrar seu percurso pela malandragem carioca e pela msica popular brasileira.

Cantando sambas de sua autoria (como Na Subida do Morro ou Bamba de Caxias, ambos em parceria com Ribeiro Cunha) ou de outros craques do gnero (como Conversa de Botequim, de Noel Rosa e Vadico, ou Piston de Gafieira, de Billy Blanco), Moreira afirmou-se como o mais importante representante de uma poca e de um estilo de vida. Esta malandragem inclui uma preguiosa averso ao trabalho, uma saudvel desconfiana em relao s foras policiais, um inegvel romantismo e, acima de tudo, muito humor.

Para contornar a ausncia de um emprego e, conseqentemente, de um salrio, o malandro recorria a diversos expedientes, do dinheiro emprestado ("Seu garom me empreste algum dinheiro, que eu deixei o meu com o bicheiro" - Conversa de Botequim) ao jogo clandestino ("L no meu cassino, tipo mal acabado, desengonado pela ventania" - Cassino de Malandro, de Raul Marques e Tancredo Silva), sem deixar de lado o sonho de ganhar na loteria ("Etelvina! Acertei no milhar, ganhei quinhentos contos, no vou mais trabalhar"" - Acertei no Milhar, de Wilson Batista e Geraldo Pereira).

A polcia era o inimigo nmero um do malandro, que nem sempre levava a melhor ("Antes que eu me desviasse, um tira forte e aborrecido me abotou" - Olha o Padilha, de Ferreira Gomes, Bruno Gomes e Moreira da Silva). Mas o tema preferido da maladragem era inegavelmente a mulher. Fosse como alvo de amores ("Que bom seria se voc quisesse morar l na minha palhoa" - Minha Palhoa, de J. Cascata) ou autora de desfeitas ("Ela quebrou o meu chapu de palhinha, a diabinha" - Risoleta, de Raul Marques e Moacyr Bernardino), a mulher quase sempre tinha destaque nas histrias dos malandros. Moreira da Silva tambm gravou o divertido samba de Noel Rosa Gago Apaixonado ("Mu-mu-mulher, em mim fi-fizeste um estrago").

O humor tem papel importantssimo na msica de Moreira, e isto fica claro na srie de sambas "cinematogrficos" que gravou na dcada de sessenta. Com letras de Miguel Gustavo, as canes contavam a histria de Kid Morengueira, alter-ego de Moreira da Silva, que circulava com a mesma agilidade no velho oeste (O Rei do Gatilho e O ltimo dos Mohicanos), na Chicago dos gangsters (Os Intocveis) ou nas rodas da alta espionagem (Morengueira Contra 007). Inspirados nas aventuras importadas de Hollywood, estes sambas so recheados de expresses estrangeiras cantadas com impagvel pronncia malndrica. O prprio Moreira conta onde aprendeu outros idiomas: "Aprendi na esquina da vida, esperando a descida de quem subiu e fazendo o confronto entre o malandro pronto e o otrio que nasceu pra milionrio. Comment a va, mon amour?"

Moreira da Silva nasceu em 1902 e morreu em 2000.


pensamentos despenteados para dias de vendaval
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