superman returns, um filme religioso
uperman Returns (EUA, 2006), do Bryan Singer, é uma alegoria religiosa. Para não deixar dúvidas, o filme começa com uma representação da Pietà (com Martha Kent abraçando no colo seu filho que retornou depois de longa ausência) e termina com o Super-Homem (interpretado por Brandon Routh) em pose de crucificação (no espaço, caindo depois de um sacrifício para salvar os humanos - ou pelo menos os humanos dos EUA, porque afinal o super-herói ficou famoso por defender a verdade, a justiça, e o american way of life).
Se a iconografia cristã não for suficiente para o espectador perceber realmente de que trata o filme, Lex Luthor (bem interpretado por Kevin Spacey, de American Beauty e The Usual Suspects) vem em nosso auxílio e não somente compara a sua missão (roubar tecnologia alienígena da fortaleza do Superman) à de Prometeu (o personagem mítico que roubou o fogo dos deuses) mas chega a ser ainda mais direto: "Deuses são seres egoístas que voam por aí com capinhas vermelhas e não dividem seu poder com a humanidade."
Superman Returns aproveita a ausência do personagem e seu retorno para questionar a necessidade por um ser superior zelando pela nossa segurança e nos salvando de perigos terríveis. Nas entrelinhas, claro, a pergunta é se precisamos de deuses ou se poderíamos viver sem eles. Quando Lois Lane (interpretada por Kate Bosworth, de Blue Crush) escreve um editorial chamado "Por que o mundo não precisa do Super-Homem", parece defender a idéia que somos auto-suficientes e, ainda que com alguns percalços, capazes de uma existência plena mesmo sem deuses que nos guiem ou protejam. Na verdade, porém, Lois estava somente irritada porque seu super-herói preferido foi embora sem se despedir: "Como você foi capaz de nos deixar dessa forma? Eu segui com a minha vida. As outras pessoas também. Foi por isso que escrevi aquilo. O mundo não precisa de um salvador. Eu também não preciso." Mas basta um vôo noturno de mãos dadas com o Superman para ela mudar de tom, e no fim já está preparada para escrever uma retratação chamada "Por que o mundo precisa do Super-Homem".
O questionamento (precisamos de deuses?) é interessante e importante, mas a comparação do dilema do filme com o mesmo dilema fora das telas não funciona. Porque os personagens de Superman Returns já viram o seu super-herói, testemunharam seus feitos em pessoa ou através dos noticiários, são até mesmo seus vizinhos, mas os espectadores, mesmo os que acreditam na necessidade absoluta de um salvador, nunca viram qualquer evidência indisputável da existência de tal entidade. E a possibilidade de existir um ser todo-poderoso assim no mundo real é quase tão grande quanto acordarmos amanhã e descobrirmos que o Super-Homem não é um personagem de ficção e que está voando nos céus da nossa cidade.